sexta-feira, 29 de dezembro de 2017

Votos natalícios



                                                                   
Cada vez menos pessoas encaram e celebram o Natal como forma de encontro ou reencontro com o agregado familiar ou a homenagem a uma criança nascida, há mais de 2000 anos, no seio duma família simples e em circunstâncias particularmente humildes que cresceu e se tornou carpinteiro, profeta itinerante e rabino, defensor dos pobres ou deserdados, activista militante contra os agiotas e as injustiças praticadas pela hierarquia religiosa e o poder do invasor romano, vigentes na época.  
Nos tempos que correm, as preferências de celebração desta data centram-se no consumismo exacerbado, festas, fogos-de-artifício, caridadezinha à moda de Isabel Jonet que pensa não existir miséria em Portugal, os portugueses é que têm «que se habituar a viver com menos», ou seja, têm que gostar de ser pobrezinhos para continuarem a ser ajudados pelo Banco Alimentar, subsidiado pelo Estado e para dar sentido à frase repetida vezes sem conta, Feliz Natal e Próspero Ano Novo.
A comunicação social repete os conceitos dos anos anteriores, tais como, o amor às criancinhas e aos idosos, retidos nos leitos hospitalares, pois as famílias não os vão buscar, mesmo já curados, e aos detidos nos calabouços, aos imigrantes e emigrantes longe dos entes queridos, aos sem-abrigo, enfim, uma enternecedora repetição de piedosas referências para convocar a comoção geral.
Os responsáveis governamentais desdobram-se em almoços e jantares, visitas aos hospitais de referência e acompanhamento nas sopas dos pobres ou convívios de solidariedade, porém, todos sabem que para mais de dois milhões de portugueses o Natal de felicidade não passa de sonho distante e a prosperidade não surgirá para muitos trabalhadores, com e sem trabalho ou despedidos sem culpa formada.
Paralelamente, entre 2008 e 2016, as ajudas à banca, BPN, BES, BCP, BPI, BANIF, descontando os ganhos que o Estado obteve, custaram o equivalente a 8% do PIB, quase seis vezes o valor do défice deste ano.
Os encargos dos contribuintes com o salvamento e a ajuda aos bancos ascendem já a 14,6 mil milhões de euros, no período que vai de 2008 a 2016, e a factura não está fechada. A maior ameaça continua a ser o BPN, que deve muito dinheiro à CGD. Os números são do Tribunal de Contas e vêm no Parecer sobre a Conta Geral do Estado referente ao ano passado, publicado nesta semana.
Só em juros, porque o Estado, sem verbas suficientes teve de pedir dinheiro emprestado aos mercados para apoiar a banca, terão sido desembolsados 1,8 mil milhões de euros, embora
tenha ganho algum dinheiro com as ajudas prestadas, juros e dividendos, mas não o suficiente. Assim, o custo líquido imputado aos contribuintes é muito elevado e ascende aos tais 14,6 mil milhões de euros, 8% do PIB, equivalente a quase seis vezes o valor do défice estimado para este ano.
Na actualização da análise aos apoios públicos ao sector financeiro, o Tribunal de Contas refere que «o esforço financeiro resultante das intervenções públicas, destinadas a apoiar o sistema financeiro nacional no seguimento da crise financeira internacional iniciada em 2007, constituiu um encargo elevado para o erário público num contexto de finanças públicas deficitárias».
Uma pergunta se coloca, neste contexto: tem razão de ser este comportamento que reflecte o desinteresse que, cada vez mais, se instala na relação para com os que nos rodeiam e as palavras ocas que o vento leva?
É indispensável mudar a narrativa das boas intenções, encarar a realidade de frente e garantir a todos os portugueses um caminho justo para as dificuldades reais que os preocupam, ou seja, afirmar-lhes que não baixará a luta contra a injustiça provocada pelas classes que se apropriam da sua força de trabalho e com ela os oprimem e exploram e garantir-lhes que tudo faremos para travar o passo aos partidos da direita e aos mascarados de esquerda que os têm espoliado, consoada após consoada e que, de ano para ano, os arrastam para um fosso social que é forçoso eliminar.

quinta-feira, 28 de dezembro de 2017

Declaração de Gonçalo Oliveira, Membro da Comissão Política do Comité Central

Sobre a Mensagem de Natal do Primeiro-Ministro

Sobre a Mensagem de Natal do Primeiro-Ministro
Ouvimos uma declaração que reafirma os eixos fundamentais daquilo que tem sido o discurso do governo PS até agora: no essencial a promessa de virar a página à política de exploração levada a cabo pelo Governo anterior e resolver os graves problemas sociais e económicos que ela causou.
E é verdade que têm sido dados passos nesse sentido. O último Orçamento do Estado, por exemplo, acrescenta algumas medidas positivas aquelas que já foram conquistadas em anos anteriores. Avanços limitados e insuficientes, sobretudo dada a situação do país, mas algo que deve ser valorizado por quem se preocupa com as condições de vida do povo português. Até porque essas medidas de reposição de rendimentos e direitos contribuíram muito para a evolução positiva da economia.
No entanto estaríamos em falha se não referíssemos as principais contradições no discurso do Primeiro-Ministro. Contradições essas que resultam do facto de, por um lado, prometer “vencer os bloqueios ao desenvolvimento do país” e pelo outro insistir na importância de manter os compromissos assumidos com a UE e com o grande capital, o que significa a submissão do país a imposições que são um constrangimento ao nosso desenvolvimento.
A questão central é esta: se a opção do governo fosse enfrentar esses constrangimentos, externos e internos que amarram o País, a resposta aos problemas que enfrentamos poderia ser muito diferente.
É importante definir como objectivo revitalizar o interior do país e reordenar a floresta, mas para manter as metas de redução do défice que o Governo decidiu e para continuar a pagar a dívida a este ritmo não pode haver o necessário investimento público, faltarão os recursos humanos e financeiros para levar à prática esses objectivos e, no final, sobram apenas promessas.
É igualmente importante definir como prioridade o emprego digno, com um salário justo, mas travar o aumento do salário mínimo nacional nos 580 euros em vez de avançar até aos 600, significa continuar a apostar nos baixos salários e na exploração de quem trabalha.
As opções estruturais do PS são bem visíveis, e convergem na prática com o PSD e CDS.
Mas o PCP tem confiança que será possível resolver estes problemas e garantir um futuro melhor para o povo. Mas esse futuro tem de ser construído.
Para o PCP a resposta aos problemas do País passa por uma ruptura com a política de direita e a adopção da política patriótica e de esquerda que o PCP propõe e que passa pela valorização dos salários e pensões, por garantir para o estado o controlo dos sectores e empresas estratégicas, pela recuperação dos serviços públicos e pela afirmação da soberania nacional, o que implica necessariamente a renegociação da dívida e libertação da submissão ao Euro.
Este é o caminho que pode garantir um futuro melhor para os portugueses.

Mensagem de Ano Novo de Jerónimo de Sousa

sexta-feira, 22 de dezembro de 2017

Promulgação do OE para 2018

NOTA DO GABINETE DE IMPRENSA DO PCP

Sobre a promulgação por parte do Presidente da República do Orçamento do Estado para 2018



1. O Sr. Presidente da República anunciou hoje a promulgação do Orçamento do Estado para 2018. Para o PCP, a apreciação do Orçamento tem de ser feita a partir do seu conteúdo concreto, do sentido das suas medidas e naturalmente das opções que são feitas perante a necessária resposta aos graves problemas nacionais.
Para o PCP, o Orçamento do Estado para 2018 consolida todos avanços alcançados nos anos anteriores e avança, fruto da persistência e intervenção do PCP e da luta dos trabalhadores e do povo português, com novas medidas de sentido idêntico. Descendo o IRS, aumentando as pensões, reforçando o apoio social aos desempregados, às crianças, às pessoas com deficiência, alargando a gratuitidade dos manuais escolares, repondo o direito à progressão nas carreiras e o pagamento por inteiro do trabalho extraordinário e nocturno, apoiando pequenos empresários, agricultores e pescadores. Medidas que marcam o sentido da política que o País precisa.
2. Quem se preocupa com as condições de vida dos trabalhadores e do povo e com o futuro do País tem de valorizar os avanços alcançados com este Orçamento. Mas não pode ignorar também que o mesmo Orçamento, globalmente, está longe de corresponder ao que é necessário para ultrapassar os problemas do País e à degradação das condições de vida provocada pela política de direita da responsabilidade de sucessivos governos PS, PSD e CDS.
Dívida, Euro, regras e política da União Europeia pesam de forma particularmente negativa, mesmo para lá das exigências externas. Nos limites e insuficiências do Orçamento do Estado para 2018, estão bem visíveis, as opções estruturais do PS e que convergem com opções e práticas do PSD e CDS.
3. Na mensagem que acompanhou a promulgação do Orçamento para 2018, o Sr. Presidente da República opta por sublinhar, mais do que a resposta aos problemas e aspirações dos trabalhadores e do povo, a necessidade de prosseguir um caminho de submissão às imposições externas que são um constrangimento ao desenvolvimento do País. Para o PCP, mais do que o risco de um futuro orçamento eleitoralista, a questão que se coloca, é a da necessidade de adoptar um rumo que valorize os salários, a produção nacional, o investimento e os serviços públicos, o desenvolvimento soberano do País. É nesse sentido que o PCP continuará a intervir.
4. Para o PCP a resposta aos problemas do País não está no regresso a um passado de agravamento da exploração e do empobrecimento, não está na continuação da política de direita seja pela via do PS, seja por via do PSD ou do CDS, seja ainda em torno de um aclamado consenso entre estes partidos que consagraria tal política. A resposta aos problemas do País precisa de uma ruptura com a política de direita e a adopção da política patriótica e de esquerda que o PCP propõe ao povo português.

INTERVENÇÃO DE JERÓNIMO DE SOUSA, SECRETÁRIO-GERAL, CICLO DE CONFERÊNCIAS 153 ANOS DO DIÁRIO DE NOTÍCIAS – OS COMPROMISSOS DE PORTUGAL COM A EUROPA

«Nada pode obrigar Portugal a renunciar ao direito de optar pelas suas próprias estruturas socio-económicas e pelo seu próprio regime político»

«Nada pode obrigar Portugal a renunciar ao direito de optar pelas suas próprias estruturas socio-económicas e pelo seu próprio regime político»


Minhas senhoras, Meus senhores,
Gostaria de agradecer o convite que me foi dirigido pela Direcção do Diário de Notícias para participar nesta conferência sob o tema “Que Europa queremos?”, uma reflexão que considero de grande importância e actualidade, sublinhando, desde logo, que não é uma e mesma coisa questionar sobre “que Europa queremos” ou sobre “que União Europeia queremos”, pois a Europa e a União Europeia são realidades evidentemente distintas, nem tão pouco aceitamos enclausurar a primeira na segunda.
Considero que para responder à questão colocada é essencial responder a questões que julgo prévias e a ela associadas, nomeadamente: como se caracteriza a actual situação na Europa? Que implicações tem esta situação para Portugal? Como Portugal pode contribuir para a Europa por que aspiramos? É através da resposta a estas questões que procurarei contribuir para a reflexão proposta.
Na nossa reflexão, consideramos que a actual situação na Europa continua marcada pelo que caracterizamos como uma crise na e da União Europeia – uma crise que não só é expressão da crise estrutural do capitalismo, como da natureza do próprio processo de integração capitalista europeu, que está correlacionado e é indissociável daquela.
Passada uma década após o pico de crise que eclodiu em 2007/2008, a União Europeia não só não superou suas graves consequências, como insistiu e acentuou os factores e as políticas que estão na origem da reprodução da crise e viu evidenciarem-se e agudizarem-se as suas contradições – de que o referendo que determinou a saída do Reino Unido constitui elemento particularmente significativo.
Saliente-se que a resposta da União Europeia à crise, designadamente à crise da União Económica e Monetária, representa, entre outros gravosos aspectos, um brutal incremento no processo de privatização de empresas públicas de sectores estratégicos, na investida contra direitos laborais e outros direitos sociais, na degradação dos serviços públicos e das funções sociais do Estado – particularmente nos países da denominada “periferia”, vulneralizados por décadas de Mercado Único e pela sua integração no Euro, que se traduziram em mais dependência, desprotecção dos seus povos e divergência económica e social.
Os denominados “programas de assistência financeira”, especificamente aplicados – como aquele que se impôs a Portugal e que caracterizámos como um Pacto de Agressão contra os trabalhadores, o povo e o País, acordado pelo PS, PSD e CDS com a União Europeia, o BCE e o FMI –, constituíram e constituem instrumentos de imposição de violentas medidas de empobrecimento e exploração – quer sobre o trabalho quer sobre os recursos públicos – e de sujeição de Estados – por via do endividamento – a uma permanente ingerência, pressão e chantagem. Denominados “programas de resgate” que não só serviram para defender os interesses das grandes potências e financiar os seus sistemas financeiros, como, por vezes, representaram autênticas experiências de um mais severo quadro ao nível da União Europeia.
Privados de instrumentos soberanos de política monetária – sem moeda própria, sem um banco central emissor e prestamista de último recurso que possa, se necessário, assistir o Estado e o sistema financeiro –, países da chamada “periferia” da Zona Euro, encontram-se mais expostos perante o aprofundamento da crise, a especulação dos denominados “mercados financeiros”, as avaliações das ditas “agências de notação” e as políticas da União Europeia ditadas pelas suas grandes potências e determinadas pelos interesses do capital transnacional.
Medidas como a baixa taxa de juro ou a liquidez fornecida pelo BCE não se traduzem, no essencial, em mais investimento e dinamização do mercado interno, como tendem a gerar novas dinâmicas especulativas. As dívidas públicas de alguns países continuam a atingir grandes proporções, constituindo um significativo obstáculo ao financiamento dos Estados e ao investimento público. Os necessários estímulos orçamentais são dificultados pelos severos e gravosos constrangimentos e condicionalismos da União Económica e Monetária.
Uma realidade que confirma que o Euro não é sobretudo um problema económico ou “técnico”, mas uma questão fundamentalmente política.
Perante a sua crise, a União Europeia utilizou-a para impulsionar um maior aprofundamento da União Económica e Monetária, com a consequente vinculação e alienação de competências soberanas de Estados face a espaços e instituições supra-nacionais da União Europeia.
O Tratado Orçamental, a “Governação Económica”, o “Semestre Europeu”, a “União Bancária”, a aplicação de condicionalidades macroeconómicas na utilização de meios financeiros da União Europeia ou a “Estratégia UE 2020”, determinam acrescidos mecanismos de controlo e de condicionamento das políticas orçamentais e económicas dos Estados com economias mais vulneráveis e dependentes – sempre em benefício do capital transnacional. Veja-se como, por via das chamadas “reformas estruturais”, a União Europeia tenta recorrentemente intervir em matérias como salários, legislação laboral, serviços públicos ou segurança social.
A resposta da União Europeia à crise não só não resolveu nenhuma das contradições que lhe são inerentes, como as acentuou. Tais como: a contradição entre os interesses dos trabalhadores e dos povos dos diferentes países que integram a União Europeia – cujos direitos são crescentemente colocados em causa – e os interesses do capital transnacional – cuja a insaciável necessidade de acumulação e centralização de capital determina o processo de integração; a contradição entre a profunda aspiração à decisão soberana e democrática por parte de um povo quanto ao seu presente e futuro, e um processo de integração que concentra o poder em instituições supra-nacionais dominadas por grandes potências e pelo capital transnacional e que confronta e desrespeita a soberania e a independência de Estados; ou a contradição entre os interesses dos países da chamada “periferia” e os interesses das grandes potências da União Europeia, e entre os diferenciados interesses de cada uma delas.
É neste quadro que a União Europeia se lança uma vez mais e vertiginosamente no aprofundamento do seu carácter federalista, neoliberal e militarista – pilares que definem a matriz e natureza deste processo de integração – ressurgindo ambiciosas e estafadas intenções, objectivos e planos, cujo acordo e/ou concretização é anunciada até Junho de 2019.
É desta forma que ressurge o aprofundamento da União Económica e Monetária – com o contínuo incremento da liberalização do Mercado Único, a criação de um “FMI” dito europeu, a criação do denominado “ministro das finanças e da economia“ ou a sempre anunciada finalização da União Bancária. Ressurge a incessante descaracterização do orçamento comunitário – enquanto instrumento das tão propaladas, como falsas, “convergência” e “coesão económica e social”. Ressurgem propostas para assegurar a precedência dos interesses das grandes potências da União Europeia nos processos de privatização, aquisição ou fusão face a outros países. Ressurgem os tratados de livre comércio – agora tendo como bitola o denominado CETA. Ressurge o aprofundamento da militarização da União Europeia – como pilar europeu da NATO e de forma dita “complementar” a este bloco político-militar. Ressurge uma política de imigração e para os refugiados – profundamente discriminatória, exploradora e desumana. Ressurge a diminuição das votações por unanimidade no Conselho – com a sua passagem para maioria qualificada. Intenções, objectivos e planos – entre tantos outros –, cujo conteúdo e concretização final será, como sempre, determinado e decidido em função da preservação da União Europeia como instrumento para assegurar o domínio político e económico das grandes potências – particularmente, da Alemanha – e a imposição da prevalência dos interesses dos seus grandes grupos económicos e financeiros.
Sublinhe-se que nenhuma das medidas até aqui avançadas pelas instâncias da União Europeia – incluindo esse embuste chamado “Pilar Europeu dos Direitos Sociais” – colocam em causa o cerne das suas políticas e orientações: de fomento do retrocesso social; de salvaguarda dos grandes grupos financeiros à custa do erário público; de assalto aos países denominados da “periferia”, nomeadamente pela sua dependência e endividamento; ou do autêntico “colete-de-forças” que representam o Tratado Orçamental, a “Governação Económica”, o “Semestre Europeu” ou a “União Bancária” para a soberania de países – entre outros numerosos exemplos. Pelo contrário, o que se vislumbra é precisamente uma investida tendo em vista o reforço destas mesmas políticas e orientações.
Ao mesmo tempo e como sempre se verificou, as instâncias da União Europeia fazem acompanhar este novo passo na “integração europeia” propalando mistificações – para dissimular os seus reais objectivos; brandindo “ameaças” e “perigos” – para fomentar sentimentos de insegurança e estados de receio; aliciando com “mundos e fundos” – para propiciar a abdicação e alienação da soberania nacional e a consequente condenação à dependência económica e à subalternidade política.
Das políticas comuns ao Mercado Único, do Acto Único a Maastricht, de Amesterdão a Nice, da derrotada “Constituição Europeia” ao recauchutado e infligido Tratado de Lisboa, do Euro e do Pacto de Estabilidade ao Tratado Orçamental – trinta anos de desenfreados saltos no processo de integração capitalista europeu comprovam que cada novo salto de índole federalista constituiu (e constituirá), na sua substância, acrescidos condicionalismos e constrangimentos à soberania de Estados e reforçados instrumentos de imposição de políticas e medidas que atentam contra direitos e anseios dos trabalhadores e dos povos.
Isto é, a “mais Europa”, ou sem eufemismos, a “mais União Europeia” que é tanto proclamada, significa, afinal, uma mais grave regressão de direitos laborais e de outros direitos sociais, o aumento da concentração e centralização da riqueza e o agravamento das desigualdades sociais e das assimetrias de desenvolvimento entre os diferentes países; significa, afinal, o fomento do militarismo e a intensificação da ingerência contra Estados soberanos e os seus povos e o empobrecimento da democracia; um crescente desrespeito de direitos humanos, de que é chocante exemplo a forma como age com os muitos milhares de imigrantes e refugiados de guerras de agressão, relativamente às quais a União Europeia é conivente e patrocina; significa o aprofundamento de políticas que abrem espaço de acção e alentam o crescimento da extrema-direita e do seu nacionalismo xenófobo e reaccionário.
Minhas senhoras, Meus senhores
Para o PCP, a actual situação em Portugal reflecte problemas acumulados ao longo de décadas de política de direita e de integração na União Europeia.
Política de direita e processo de integração na União Europeia que, interligados, conduziram o País a uma situação de crescente fragilização e subalternização.
Crise, perversão do regime democrático, definhamento económico, retrocesso social e aumento da exploração,, empobrecimento cultural e degradação ambiental, acentuação do carácter periférico e dependente do País – são traços que decorrem de um processo que ameaça seriamente a soberania e independência nacionais, que compromete o presente e o futuro do País e que urge ser interrompido e superado.
Sujeito ao duplo garrote do “défice” e da “dívida pública” e confrontado com a inexistência de instrumentos de política monetária, cambial e orçamental, Portugal passou por um longo período de estagnação económica desde a adesão ao Euro em 1999.
Uma situação que se degradou de forma mais acentuada com um violento processo de “ajustamento” a que Portugal foi sujeito e que teve consequências económicas e sociais devastadoras.
Uma realidade que foi e é agudizada por importantes constrangimentos que comprometem um efectivo desenvolvimento do País, designadamente: uma moeda - o Euro - , desfasada e crescentemente em confronto com os interesses nacionais; uma dívida insustentável; uma banca dominada pelo grande capital.
Tendo sido possível interromper a política de aguda destruição conduzida pelo anterior governo do PSD e CDS e abrir uma nova fase na vida política nacional, capaz de fazer avançar medidas para responder a alguns dos problemas mais sentidos pelo povo português – ainda que aquém do que seria possível e necessário –, a situação do País continua, no entanto, profundamente marcada pelas consequências de décadas de política de direita, de integração na União Europeia e pelo domínio monopolista da economia nacional, como são os agravados défices estruturais existentes no plano produtivo, energético, científico, alimentar e demográfico.Demonstrando a actual situação nacional que pode haver outro caminho que não o de mais exploração, liquidação de direitos e empobrecimento, esta evidencia igualmente o carácter crescentemente inconciliável entre os condicionalismos impostos pela União Europeia e o Euro e uma política que aprofunde o caminho de reposição de direitos, de aumento de salários, das reformas, pensões e apoios sociais e de desenvolvimento soberano.
Para o PCP, a actual fase da vida política nacional, sem prejuízo das possibilidades que abre e que não devem ser desperdiçadas, evidencia ainda mais o indispensável objectivo de ruptura com a política de direita e a necessidade de uma outra política – uma política patriótica e de esquerda - que o PCP considera indispensável para libertar o País das limitações e constrangimentos que bloqueiam o seu desenvolvimento.
Uma política que, como temos afirmado, pela sua dimensão patriótica, inscreve a soberania e independência nacionais como objectivo central, afirmando o direito inalienável do poder de decisão do povo português sobre as opções e orientações indispensáveis para as concretizar, e a prevalência dessa vontade soberana sobre todos e quaisquer constrangimentos e imposições externas.
Uma política que tem como elementos decisivos: a libertação do País da submissão ao Euro e das imposições e constrangimentos da União Europeia; a renegociação da dívida pública; a valorização do trabalho e dos trabalhadores; a defesa e promoção da produção nacional e dos sectores produtivos; a garantia do controlo público da banca, recuperação para o sector público dos sectores básicos estratégicos da economia; a garantia de uma administração e serviços públicos ao serviço do povo e do País; a defesa de uma política de justiça fiscal que alivie a carga fiscal sobre os rendimentos dos trabalhadores e do povo, combata os paraísos fiscais; a defesa do regime democrático e do cumprimento da Constituição da República Portuguesa.
Política patriótica e de esquerda que, na consideração do PCP, representará o melhor e mais efectivo contributo que o povo português e Portugal pode dar para a conquista de uma Europa que rompa com o federalismo, o neoliberalismo e o militarismo da União Europeia e afirme uma europa de cooperação, de progresso social e de paz.
Para o PCP, a internacionalização da economia, a profunda divisão internacional do trabalho, a interdependência e cooperação entre Estados e os processos de integração, correspondem a realidades e tendências que, em função da sua orientação, características e objectivos, podem servir o capital transnacional ou podem servir os povos.
Gostaria de frizar que, do mesmo modo e com o mesmo empenhamento com que rejeita soluções autárcicas e isolacionistas, bem como o chauvinismo, o nacionalismo e o racismo, o PCP recusa alianças e relações redutoras da soberania nacional e empobrecedoras da democracia, e defende uma acção com vista à revisão, anulação ou desvinculação de tratados e compromissos lesivos do interesse nacional e da paz mundial.
Uma das mais fortes exigências que emerge do mundo em mudança em que vivemos, não é de gravosas abdicações de soberania, de empobrecedoras uniformizações e de ampliação da distância entre os centros de decisão e os povos, mas da pujante afirmação da riqueza das diferenças, das identidades nacionais, do reconhecimento do direito das nações a um poder político soberano, da aspiração à igualdade de direitos e a novas formas de cooperação.
Neste sentido, o PCP considera indispensável a afirmação por Portugal de uma política que se desenvolva em seis direcções principais e interligadas:
- Defender sempre firmemente os interesses portugueses, designadamente nas instituições europeias, combatendo decisões que os prejudiquem;
- minimizar com medidas concretas os condicionalismos e consequências negativas da integração;
- lutar contra as imposições supranacionais e as limitações à democracia e à vontade dos povos;
- reclamar e utilizar a favor do progresso de Portugal e do bem-estar dos portugueses todos os meios, recursos e possibilidades;
- agir especificamente e em articulação com os trabalhadores e os povos de outros países para romper com o processo de integração capitalista europeu e promover uma Europa de paz e cooperação baseada em Estados livres, soberanos e iguais em direitos;
- lutar por um desenvolvimento soberano de acordo com os interesses nacionais dos trabalhadores e do povo, cuja concretização deve prevalecer face a condicionamentos ou constrangimentos, assumindo as exigências, caminhos e opções que a situação coloque como necessários.
Para o PCP, nada pode obrigar Portugal a renunciar ao direito de optar pelas suas próprias estruturas socio-económicas e pelo seu próprio regime político. Nada pode obrigar Portugal a aceitar a posição de Estado subalterno no quadro da União Europeia e a alienar a sua soberania e independência nacionais. O povo português tem, e deverá sempre ter, o pleno direito de decidir do seu próprio destino e de escolher os caminhos que entender mais conformes com a sua identidade histórica e com os seus interesses e aspirações.

Eleições na Catalunha

NOTA DO GABINETE DE IMPRENSA DO PCP

Sobre as eleições regionais de 21 de Dezembro na Catalunha



As eleições regionais de 21 de Dezembro na Catalunha, realizadas em circunstâncias anormais, antidemocráticas, com destacados candidatos presos ou perseguidos, representam uma séria derrota da política centralista, reaccionária e repressiva conduzida pelo governo minoritário do Partido Popular (que teve um resultado humilhante) e confirma a necessidade de encontrar para a questão catalã, no quadro de uma resposta mais geral para a questão nacional em Espanha, uma solução política que respeite os direitos democráticos e sociais dos cidadãos da Catalunha e os seus sentimentos nacionais.
Uma tal solução compete soberanamente aos povos de Espanha. O PCP condena o apoio que tem sido dado pela União Europeia à política antidemocrática do governo de Mariano Rajoy e insiste em que a posição dos órgãos de soberania de Portugal deve pautar-se pelo respeito estrito da Constituição da República Portuguesa.
O PCP salienta o significado da elevada e histórica participação do povo catalão no acto eleitoral e, considera urgente que sejam anuladas as medidas de inaceitável intolerância antidemocrática tomadas na sequência do referendo de 1 de Outubro contra dirigentes políticos e membros do governo regional da Catalunha.

NOTA DO GABINETE DE IMPRENSA DO PCP

É tempo de libertar os CTT da ruinosa gestão privada!

É tempo de libertar os CTT da ruinosa gestão privada!
1. A Administração dos CTT tornou público mais um pacote de medidas destinadas a garantir a distribuição de chorudos dividendos aos seus accionistas. Medidas que são consequência de um criminoso processo de privatização que o Governo PSD/CDS culminou, após longos anos de uma preparação que contou com o envolvimento do PS. Anunciam o despedimento de trabalhadores (mais 800), a venda de património e o encerramento de estações e postos. Este pacote soma-se ao que estava já em curso, com a tentativa de despedimento de outros 340 trabalhadores na sequência de uma previsão de lucros para 2017 de «apenas» 19 milhões de euros.
Estamos a assistir ao aprofundar do caminho desastroso aberto com a privatização dos CTT, com os grupos económicos que hoje controlam a empresa a descapitalizá-la, a alienar património, a degradar o serviço a níveis escandalosos. Um caminho que já implicou: um aumento de 47% na tarifa do correio normal desde a privatização; que entre 2009 e 2016 tenham encerrado 564 estações e postos de correios; que largas centenas de postos de trabalho tenham já sido destruídos; que o correio demore hoje mais tempo a chegar ao destino do que demorava há trinta anos; que património tenha sido vendido para suportar o pagamento de dividendos, como aconteceu esta semana com a venda do Palácio da Rua de São José por 23 milhões de euros, permitindo pagar dividendos muito acima do resultado líquido da empresa.
2. Invocam neste documento as quebras na circulação do correio postal para justificar um salto qualitativo no saque à empresa e aos trabalhadores, quando já hoje o serviço público é uma sombra do que foi. O correio chega cada vez a menos pessoas, cada vez mais tarde e cada vez mais caro. E o problema não está no correio electrónico, que a empresa aliás nunca “quis” desenvolver. Nem no número de trabalhadores, que são muito menos do que aqueles que seriam necessários. O problema dos CTT está na incompatibilidade entre o papel estratégico do serviço público que está obrigado a prestar e o objectivo único dos grupos económicos: os seus lucros.
Os objectivos da administração dos CTT são claros e o Governo não pode mostrar desconhecimento sobre a dimensão desta ofensiva, como fez o Primeiro-Ministro no debate quinzenal na Assembleia da República. A serem concretizadas as intenções dos grupos monopolistas, o serviço público postal universal desaparecerá como tal e a destruição da empresa deixará de ser apenas uma possibilidade.
Para o PCP, o Governo não pode permitir a concretização deste plano.
3. Cresce a indignação nacional contra esta privatização, e multiplicam-se as vozes que exigem a imediata reversão da privatização dos CTT, condição necessária para preservar e reconstruir o serviço público postal universal.
Apesar disso, no passado dia 15 de Dezembro, uma proposta do PCP visando a recuperação do controlo público, foi chumbada na Assembleia da República por PS, PSD e CDS, tendo a Assembleia (com os votos de PS, PCP e BE) limitado-se a mandatar o Governo para realizar uma urgente «avaliação e estudo das opções quanto ao contrato de concessão», e das «alternativas, de outra natureza, que se colocam».
Para o PCP, essa avaliação terá que ser urgente e abrangente, incluindo sobre a natureza da propriedade dos CTT. Os custos que o País está a suportar com esta privatização reclamam uma avaliação profunda sobre todas as consequências da continuação deste processo, bem como, a identificação das opções e passos a dar visando a recuperação do controlo público da empresa. E não basta o resgate da concessão do serviço público, como diz o BE. Pois se os accionistas podem prescindir da concessão já o Estado não pode prescindir da empresa para garantir o serviço público, o que exclui também, qualquer opção de entregar a concessão a outro grupo económico privado. Atrasar, empatar, ludibriar a questão de fundo que é a decisão sobre o controlo da empresa, é estar conivente com os interesses do grande capital. É essa a opção que o Governo PS terá de fazer.
4. Da parte do PCP, que há precisamente um ano confrontou o Governo, pela voz do seu Secretário-geral, sobre a degradação dos Correios, a defesa dos CTT não é um episódio na sua intervenção, é um compromisso que prosseguirá e que se assume também na solidariedade com a luta dos trabalhadores que hoje estão em greve e com a luta dos utentes. Uma luta que deve ser intensificada, numa afirmação de confiança na possibilidade de libertar os CTT da gestão privada e de retomar o serviço postal público e universal de qualidade que os CTT sempre prestaram enquanto empresa pública.

«O PCP propôs o aumento para 600 euros em Janeiro de 2018 e o PS recusou»

domingo, 10 de dezembro de 2017

Uma irresponsabilidade

Nota do Gabinete de Imprensa do PCP

Sobre o reconhecimento pelos EUA de Jerusalém como capital de Israel

O PCP condena veementemente o reconhecimento de Jerusalém como capital de Israel hoje anunciado pelo Presidente norte-americano, uma decisão que representa um apoio explícito por parte dos EUA à política sionista de Israel e uma agressão frontal ao martirizado povo palestiniano e provocação aos povos árabes, com perigosas e imprevisíveis consequências.
O PCP considera esta decisão – a que está associada à anunciada transferência da Embaixada dos EUA para Jerusalém –, tão mais grave quando é tomada num momento em que se tornam cada vez mais claros os planos para uma nova escalada militar na região, que encerra o perigo duma enorme confrontação, com consequências para além do Médio Oriente.
O PCP considera que o Governo português deve – no respeito pela Constituição da República Portuguesa e de decisões adoptadas pela Assembleia da República relativas ao reconhecimento do direito do povo palestiniano à edificação do Estado da Palestina, nas fronteiras anteriores a 1967 e com capital em Jerusalém Leste – condenar de forma inequívoca a decisão agora tomada pela Administração norte-americana.
A decisão da Administração norte-americana – que viola abertamente o Direito Internacional e numerosas resoluções do Conselho de Segurança da ONU sobre o estatuto de Jerusalém, desde logo a Resolução 478 que explicitamente determina a saída das missões diplomáticas dessa cidade, bem como a Resolução 2334 de Dezembro de 2016 que, condenando o prosseguimento da expansão de colonatos israelitas em território palestiniano, reitera que o estatuto de Jerusalém apenas pode ser decidido pela via negocial – constitui um novo e sério obstáculo à necessária solução negociada da questão palestiniana e coloca em evidência o papel hipócrita dos EUA relativamente à justa resolução do conflito.
A decisão agora adoptada não pode ser desligada das medidas da Administração norte-americana para sabotar o acordo nuclear com o Irão; das agressões militares de Israel em território sírio; dos anúncios da constituição duma «NATO do Médio Oriente» dirigida contra o Irão e que envolve ditaduras do Golfo; dos conflitos fomentados pela Arábia Saudita, histórico aliado dos EUA, contra o Iémen e outros países da região; do recrudescimento de ataques terroristas em países como o Egipto; das insistentes declarações de dirigentes de Israel ameaçando com conflitos militares directos com o Irão e o Líbano – um quadro de degradação generalizada da situação que é fomentado pelos sectores mais aventureiros e belicistas do imperialismo, confrontados com uma cada vez mais clara derrota dos seus planos de desestabilização e caos terrorista na Síria, graças à resistência do povo sírio e à ajuda que recebeu de outros países e forças, agora na mira desses mesmos sectores.
O PCP considera que deverão ser encetadas ao nível da ONU medidas que condenem e demovam a Administração norte-americana de uma decisão que constitui uma provocação e um passo muito grave na escalada de tensão e conflito no Médio Oriente.
O PCP reafirma a sua solidariedade de sempre com o povo palestiniano e à sua legítima e heroica luta de sete décadas pelo direito à constituição dum Estado soberano e viável, nas fronteiras anteriores a 1967 e com capital em Jerusalém Leste, e pelo respeito do direito de regresso dos refugiados palestinianos que a política de expansão e ocupação da Palestina por parte de Israel gerou.
Considerando que a solidariedade para com o povo palestiniano é hoje mais necessária do que nunca, o PCP apela a todas as forças amantes da paz a que manifestem a sua firme oposição, não apenas às medidas agora anunciadas pela Administração norte-americana, como aos planos e ameaças de escalada nas agressões militares, que já destruíram vários países do Médio Oriente e que representam uma muito real e grave ameaça à paz, na região e no mundo.

Intervenção de Jerónimo de Sousa, Secretário-Geral, Desfile «Defesa de Transportes Públicos de Qualidade»

«É preciso continuar a luta em defesa do direito à mobilidade, em defesa dos transportes públicos, dos direitos dos trabalhadores e dos utentes»

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Queria, em primeiro lugar, saudar-vos e saudar a participação de todos vós nesta luta que se junta a muitas outras que estamos a travar, em defesa de melhores condições de vida das populações.
A política de direita, a submissão ao Euro e às imposições da União Europeia, as opções que prevaleceram ao longo dos anos de favorecimento dos interesses dos grupos monopolistas, a acção destruidora do último Governo PSD/CDS e a concretização do Pacto de Agressão das troikas, conduziram a uma situação insustentável para a maioria das empresas públicas de transportes e a um grave retrocesso no direito à mobilidade do povo português. Cortes nos orçamentos das empresas, agravamento da exploração dos trabalhadores e redução de quadros operacionais, desinvestimento em frotas e equipamentos, abandono dos serviços de manutenção, privatizações e concessão de serviços a grupos económicos, encerramento de linhas e carreiras, aumento dos preços e tarifas, contribuíram para uma realidade em que os problemas da mobilidade são dos mais sentidos por parte das populações.
Nada que não se tenha também verificado noutras dimensões da vida nacional. Na saúde, na educação, na cultura, na protecção civil, na segurança pública, na defesa, nos serviços do Estado de apoio aos sectores produtivos, a política de severas restrições orçamentais associada ao favorecimento dos interesses dos grandes grupos económicos, impôs uma realidade de enorme fragilidade das empresas e serviços públicos que só pode responsabilizar os partidos – PSD, PS e CDS – que, ao longo dos anos, foram aceitando como válida a doutrina neoliberal, as imposições da União Europeia, as privatizações, a redução do número de trabalhadores, a desertificação do território, o abandono da produção nacional.
Para o PCP, não será seguramente necessário esperar por uma qualquer catástrofe, falha de segurança ou acidente nos transportes públicos para olhar para este problema. O diagnóstico que já hoje existe, e que o PCP há muito tem vindo a denunciar, reclama uma resposta urgente e estrutural capaz de inverter o caminho de degradação do direito à mobilidade com segurança.
Nos últimos meses o PCP tem vindo a denunciar a inquietante e contínua degradação do serviço público de transportes e a questionar o governo minoritário do PS, apresentando também propostas que se têm revelado cada vez mais necessárias e urgentes.
Apesar de avanços alcançados em vários domínios da vida nacional nos últimos dois anos, toda a gente está de acordo numa coisa: a degradação sistemática dos transportes públicos tem sido uma constante e estão cada vez piores!
As causas são as restrições absurdas impostas às empresas públicas, proibindo-as de contratar os trabalhadores em falta, proibindo-as de manter um correcto provimento de peças sobressalentes, proibindo-as de cumprirem os planos de manutenção, proibindo-as de investir atempadamente na modernização das frotas e das infraestruturas.
É uma evidência que a principal responsabilidade é do anterior governo PSD/CDS. Mas o actual Governo PS não dá prioridade à resolução deste problema e tarda em «acordar» para a sua preocupante dimensão. Mostra-se mais ligeiro a fazer promessas do que em inverter o rumo que está a ser seguido.
Veja-se a situação do Metro de Lisboa. Apesar da necessidade urgente da entrada de trabalhadores para a Manutenção do Metropolitano, apesar dos pedidos públicos e insistentes da própria Administração do Metropolitano de mais 22 trabalhadores para a Manutenção, apesar dos compromissos públicos de que pelo menos 10 entrariam durante o ano de 2017, apesar do inferno para os utentes que está a implicar a paralisação de mais de 30 comboios, apesar de tudo isto, o Governo continua sem autorizar a entrada de trabalhadores para a Manutenção do Metropolitano tal como se arrasta a contratação de maquinistas há muito anunciada, com as consequências que estão à vista nas dezenas de estações de metro onde se acumulam milhares de passageiros, onde se verificam atrasos inqualificáveis, onde a degradação do serviço prestado e o agravamento das condições de segurança fazem temer por situações que colocam em risco os utentes e trabalhadores do metro.
Veja-se a situação da Transtejo e da Soflusa, cujos utentes estão a viver uma situação caótica com contínuos cortes e supressões na oferta programada que tem afectado profundamente os utentes que residem ou que têm que se deslocar aos concelhos de Almada, Seixal, Barreiro e Montijo, para Lisboa. São dezenas de milhar de trabalhadores e de estudantes que todos os dias se amontoam nos cais de embarque das duas margens, criando uma situação insustentável. A vida de milhares de trabalhadores está a ser transformada num inferno, não apenas pelo transtorno que envolve a vida de cada um, mas também dos riscos, incluindo de segurança por acumulação de centenas de pessoas nos cais de embarque, mas também pela fragilidade das manutenções aos navios.
A Carris, onde se avançou com a sua municipalização, continua também a braços com problemas na frota, na contratação de trabalhadores e na qualidade do serviço prestado.
O PCP considera que o problema que está colocado ao conjunto dos transportes públicos na Área Metropolitana de Lisboa precisa de uma resposta urgente.
O Governo PS não pode continuar a adiar os investimentos que tem vindo a anunciar. É urgente inverter esta situação que se vive na Transtejo, na Soflusa, no Metro de Lisboa.
É urgente dotar o serviço destas empresas com mais trabalhadores e alargar a oferta com o o aumento do número de circulações. É urgente o investimento na manutenção e aquisição de navios.
Foi nesse sentido que o PCP ainda recentemente interveio no debate em torno do Orçamento do Estado para 2018, propondo o fim das restrições à contratação de mais trabalhadores, propondo o fim do recurso às chamadas cativações que limitam a resposta por parte das empresas, propondo o reforço do investimento público em mais 23 milhões de euros, quer no Metro de Lisboa quer nas empresas de transporte fluvial, proposta esta que viria a ser recusada uma vez mais por PSD, pelo CDS e também pelo próprio PS. E a nossa perplexidade é ainda maior quando o Governo minoritário do PS, apesar da degradação da oferta pública, a única decisão que tomou recentemente foi a de um aumento dos preços dos transportes públicos para o próximo ano de cerca de 2%. É um aumento que consideramos inaceitável e que retoma aspectos da política do anterior Governo PSD/CDS.
Camaradas e amigos
O PCP não esquece a importância que teve a derrota do processo de privatização do Metro e da Carris que o Governo do PSD/CDS tinha iniciado. Mas a situação actual, 2 anos depois, com a ausência de respostas por parte do actual governo está novamente a criar as condições para que a ameaça da privatização volte a pairar sobre os trabalhadores e os utentes destas empresas. Não é esse o rumo que os transportes na área metropolitana de Lisboa precisam. Antes pelo contrário:
É urgente garantir os meios humanos e técnicos em falta na manutenção do Metropolitano de Lisboa, autorizar a reposição dos «stocks» de sobressalentes, e iniciar um plano de reparação do material circulante que recoloque em circulação os 31 comboios que hoje estão imobilizados;
É preciso adjudicar a obra de modernização da infraestrutura e lançar os concursos para a aquisição de material circulante para a Linha de Cascais;
Também aqui é necessário, e com urgência, superar a falta de recursos humanos na manutenção de comboios e nas estações da CP, aumentando a oferta e melhorando a sua qualidade e segurança;
É fundamental implementar um plano de manutenção e modernização da frota e pontões da Transtejo e da Soflusa e reconstruir os serviços próprios de manutenção, repondo os «stocks» de consumíveis e sobressalentes e o quadro de pessoal;
É preciso recuperar os níveis de oferta da Carris, alargando a rede e a frequência, e recuperando a estrutura de informação aos utentes;
É necessário concretizar o alargamento do Passe Social Intermodal a toda a Área Metropolitana, a todos os operadores e todas as carreiras, alargando a mobilidade com menores custos para os utentes.
Para o PCP, o sistema público de transportes, designadamente nas áreas metropolitanas, não é nem poderá ser, a soma de umas quantas empresas, parte delas privadas e sustentadas pelo erário público. Esse é o caminho que inferniza a vida de milhões de pessoas, que as trata como se fossem uma mercadoria e não seres humanos, que impõe horas e horas de espera nas paragens, nos cais e estações de embarque, que prolonga a jornada de trabalho nos movimentos pendulares a um nível insustentável, que deixa populações isoladas, que empurra milhares de pessoas para o transporte individual congestionando o trânsito, entupindo ruas e avenidas, degradando o ambiente, agravando o défice energético do País tornando-o cada vez mais dependente.
A situação a que se chegou reclama um programa de emergência para investimento nos transportes públicos que o PCP tem vindo a propor, garantindo as condições de funcionamento eficaz e um sistema de transportes públicos nacional, um passe social intermodal alargado e acessível nas áreas metropolitanas visando a progressiva substituição do transporte individual.
A actual situação do País, os recentes acontecimentos verificados em várias dimensões da vida nacional, provam que o povo português está a pagar bem cara a política de abandono e degradação dos serviços públicos, das empresas públicas e das funções do Estado. Os governos não podem apenas reagir quando acontece uma tragédia. O poder e os interesses dos grupos monopolistas, o sorvedouro dos juros da dívida, as imposições da União Europeia feitas em nome da moeda única, não se podem sobrepor às necessidades do País e do povo português.
É pois preciso continuar a luta em defesa do direito à mobilidade, em defesa dos transportes públicos, dos direitos dos trabalhadores e dos utentes.
O PCP não só não desiste desse combate como apela aos trabalhadores e às populações para que intensifiquem a luta.
O PCP prosseguirá a sua acção para a solução dos problemas nacionais, indissociável da política patriótica e de esquerda que Portugal precisa.

Centenário da Revolução de Outubro

Intervenção de Jerónimo de Sousa, Secretário-Geral, Sessão Evocativa do Centenário da Revolução de Outubro

É no socialismo que os trabalhadores e os povos encontrarão resposta para as suas aspirações

É no socialismo que os trabalhadores e os povos encontrarão resposta para as suas aspirações
Encerramos aqui, na cidade do Porto, as Comemorações do Centenário da Revolução Socialista de Outubro - a primeira revolução vitoriosa que assume o objectivo da construção de uma sociedade nova, liberta da exploração do homem pelo homem - que, por iniciativa do PCP, se têm vindo a realizar em todo este ano de 2017.
Essa Revolução, esse heróico empreendimento que inaugurou uma nova época histórica - a da passagem do capitalismo ao socialismo – e que iria não só alterar profundamente a vida dos trabalhadores e do povo do País dos sovietes, mas promover e influenciar alterações profundas no mundo a favor dos trabalhadores e dos povos.
Essa Revolução que tomou nas mãos a tarefa de rasgar novos caminhos, nunca antes experimentados, materializando o milenar sonho de emancipação e de libertação de gerações de explorados e oprimidos.
Essa Revolução em que, pela primeira vez, a classe operária e os seus aliados conquistaram o poder, e com esse novo poder proletário e camponês conquistado encetaram um extraordinário processo de transformação e realização, onde milhões de seres humanos outrora excluídos e espoliados de qualquer intervenção política e social se tornaram protagonistas e obreiros do seu próprio futuro.
Esse feito notável realizado sob a direcção do Partido Bolchevique e de Lenine, confirmando a perspectiva política e ideológica apontada pela obra teórica de Marx e Engels.
Chegámos ao fim das comemorações concretizando um amplo programa de iniciativas que, com sucesso, desenvolvemos por todo o País. Realizámos centenas de debates, sessões político-culturais, exposições, sessões de cinema, produzimos vídeos, edições de obras significativas.
Promovemos um importante Seminário com aprofundadas reflexões e comunicações, abordando o amplo e variado leque de temas e que são um instrumento de trabalho para aqueles, que como nós, não desistiram de lutar e procuram na experiência passada, própria e alheia, positivas e negativas, os ensinamentos para os combates que temos pela frente.
Assinalámos o dia 7 de Novembro – o dia da Revolução - num ambiente de entusiasmo e grande confiança no futuro, confirmando e reafirmando a validade do socialismo e do comunismo como solução para dar resposta aos grandes problemas dos povos e da humanidade.
Chegámos ao fim das comemorações, mas não do combate pela afirmação dos nobres ideais e valores da Revolução de Outubro e das suas realizações. Um combate que vai inevitavelmente prosseguir, porque este património da luta dos trabalhadores e dos povos, esta primeira experiência de construção de um mundo novo e diferente, liberto da exploração, continua no centro da luta ideológica nas sociedades capitalistas contemporâneas e independentemente das adversidades que enfrentou, dos erros cometidos ou do retrocesso verificado continua a indicar a possibilidade de uma saída alternativa ao capitalismo. Uma saída, percorrendo certamente novos e diferentes caminhos, com novas e diferentes soluções, porque não há um modelo único de construção de socialismo. E é isso que os defensores do sistema de exploração – o grande capital e o imperialismo - temem.
Isso ficou particularmente patente no decorrer deste período comemorativo, também aqui no nosso País com a feroz campanha de mentiras e mistificações que desenvolveram e desenvolvem contra a Revolução de Outubro.
Assim procedem porque sabem quão justa e verdadeira é a consigna da Comemoração do Centenário da Revolução - “Socialismo, exigência da actualidade e do futuro”.
Sim, nós comemorámos a Revolução de Outubro mais do que virados para o passado, mas olhando essencialmente para o presente e para o futuro.
Comemorámos pelo que significou de realizações inéditas a favor dos trabalhadores e dos povos – as mais avançadas no processo de libertação da humanidade de todas as formas de exploração e opressão -, mas também e, particularmente, para afirmar que outro mundo é possível e que o capitalismo não é o sistema terminal da história da humanidade.
E não é porque simplesmente o afirmemos, mas porque o capitalismo não tem soluções para os problemas do mundo contemporâneo. Pelo contrário, a sua acção aprofunda todos os problemas e, por toda a parte, está permanentemente em confronto com as necessidades, os interesses, as aspirações dos trabalhadores e dos povos.
Corroído por uma profunda crise é a sua natureza exploradora, opressora, predadora e agressiva que vem cada vez mais ao de cima, com dramáticas e brutais consequências para a vida dos povos e para o futuro da humanidade.
Após a desintegração da URSS o imperialismo lançou-se numa violenta ofensiva ideológica, apresentando o capitalismo como um sistema superior e inultrapassável, ao mesmo tempo que anunciava uma nova ordem mundial, onde reinaria a democracia, a paz e o desenvolvimento harmonioso em todo o planeta.
Era o reino da abundância para todos os povos que se anunciava e proclamava com o capitalismo globalizado, agora em roda livre e sem condicionantes.
Nessa altura o PCP bem dizia quanto enganadores eram tais anúncios e proclamações, porque o capitalismo não iria mudar a sua natureza, como sistema de exploração. Ele continuaria marcado pelas injustiças, pelas desigualdades e pelos flagelos sociais. E a vida confirma-o.
Na verdade, o primeiro Estado socialista deixou de existir, mas não desapareceu nem a exploração, nem a luta de classes, e muito menos as contradições do capitalismo inerentes à sua natureza de classe, com o mundo exposto mais perigosamente à lógica exploradora e agressiva do grande capital.
E as consequências estão hoje à vista, mais de duas décadas e meia depois desses acontecimentos.
O proclamado reino da democracia e da abundância do capitalismo globalizado, está aí no aprofundamento das desigualdades sociais e entre países, no aumento da concentração da riqueza a favor do capital transnacional, no agravamento da exploração, do desemprego, da precariedade, no aumento das injustiças sociais, com brutais custos para os trabalhadores e para os povos.
O anunciado caminho do desenvolvimento, deu lugar à grande regressão que há muito está em marcha, em permanente agravamento com a ofensiva do grande capital contra os direitos laborais e sociais, os serviços públicos, a soberania dos povos.
O paraíso da abundância, do progresso e da paz foi imediatamente desmentido nos ex-países socialistas onde a restauração capitalista se saldou num enorme desastre económico e social. Mais de 100 milhões de pessoas atiradas para a pobreza em meia dúzia de anos; uma diminuição drástica da esperança média de vida; e uma gigantesca recessão com contracções do PIB e da produção industrial na ordem dos 50%.
No plano mundial os grandes números da situação social falam por si. Entre 1988 e 2011 os rendimentos do 1% da população mais rica do mundo (que detém hoje 99% da riqueza mundial) cresceu a um ritmo 182 vezes superior aos rendimentos dos 10% mais pobres. Sete em cada dez países do Mundo viram nos últimos 30 anos aumentar a sua desigualdade de rendimentos. Esta desigualdade disparou nos últimos cinco anos, conduzindo-nos a esse dado que tanto revela da natureza do capitalismo: 8 pessoas detêm a mesma riqueza que três mil e seiscentos milhões de pessoas, metade da Humanidade.
É essa natureza do sistema capitalista que faz com que, existindo recursos para garantir a alimentação, a saúde, o emprego e rendimentos à totalidade da população mundial, mais de 800 milhões de pessoas passem fome e um em cada três seres humanos viva oficialmente abaixo do limiar da pobreza definido pela ONU.
Mas enquanto assim é, o grande capital multinacional, as grandes corporações, fogem descaradamente aos impostos como o mostram os sucessivos relatórios que se vão conhecendo dos offshores, concentrando cada vez mais riqueza, ao mesmo tempo que impõem vergonhosas políticas fiscais a favor dos mais poderosos e mais ricos , como a que acaba de ser aprovada nos Estados Unidos da América de Trump, com o mesmo falso pretexto de incentivar o investimento que por aqui vimos nestes anos da troika e pela mão do PSD e CDS.
Hoje temos o mundo marcado por uma grande instabilidade e incerteza em consequência da violenta ofensiva exploradora e agressiva do imperialismo, contra todos aqueles que considera serem um obstáculo ao seus intentos.
O grande capital incrementa o ataque aos direitos sociais e económicos, às liberdades e direitos democráticos, à soberania nacional, promove valores retrógrados, reaccionários e anticomunistas, e promove e instrumentaliza forças de extrema-direita e de cariz fascista.
A escalada agressiva do imperialismo assume uma particular gravidade, particularmente do imperialismo norte-americano, que – no quadro dum imenso e contraditório processo de rearrumação de forças à escala mundial – procura contrariar seu declínio relativo e impor o seu domínio hegemónico, promovendo uma escalada de tensão e provocação, operações de ingerência e guerras de agressão por todo o mundo – numa espiral de violência que, se não for travada, conduzirá a Humanidade à catástrofe.
Toda uma evolução que confirma que o capitalismo está por toda a parte em permanente confronto com as necessidades, os interesses, as aspirações dos trabalhadores e dos povos. Que não é reformável, humanizável ou regulável!
São muitos os problemas e as dificuldades a vencer, mas é no socialismo e não no capitalismo que os trabalhadores e os povos encontrarão resposta para as suas aspirações de liberdade, igualdade, justiça, progresso social e paz.
Sim, o mundo precisa do socialismo! Ele é uma necessidade que emerge com redobrada actualidade na solução dos problemas da humanidade. Uma necessidade que exige ter em conta uma grande diversidade de soluções, etapas e fases da luta revolucionária, certos de que não há “modelos” de revoluções, nem “modelos” de socialismo, como sempre o PCP defendeu, mas sim, leis gerais de edificação socialista: poder dos trabalhadores, socialização dos principais meios de produção, planeamento - e, sobretudo, como elemento decisivo, a edificação de um Estado democrático que promova e assegure a participação empenhada e criadora das massas na edificação da nova sociedade.
E não é o facto de o empreendimento da construção da nova sociedade socialista se ter revelado mais difícil, mais complexa e mais acidentada do que nós, comunistas prevíamos, que se podem pôr em causa as suas realizações, a sua justeza e a sua necessidade.
Nas condições de Portugal, a sociedade socialista que o PCP aponta ao nosso povo, passa pela etapa que caracterizámos de uma Democracia Avançada, uma etapa que sendo parte integrante da luta pelo socialismo, a sua realização é igualmente indissociável da luta que hoje travamos pela concretização da ruptura com a política de direita e pela materialização de uma política patriótica e de esquerda que dá corpo a essa construção, num processo que não separa, antes integra de forma coerente o conjunto de objectivos de luta.
Também em Portugal a alteração da correlação de forças na situação mundial resultante do desaparecimento do socialismo como sistema mundial teve impactos profundamente negativos num País que tinha realizado uma Revolução com profundas transformações na vida dos portugueses.
A agenda do capitalismo dominante de liberalização, privatização e financeirização da economia, assumida de forma reforçada e ampliada pela política de direita de sucessivos governos do PS, PSD e CDS, conduziu à destruição das conquistas de Abril e em consequência ao agravamento de todos os problemas nacionais, com a liquidação que promoveu dos sectores estratégicos da economia, dos principais sectores produtivos nacionais e dos direitos laborais e sociais dos trabalhadores e do povo.
Uma política que haveria de acabar por entregar os destinos do País à intervenção estrangeira do FMI, União Europeia e Banco Central Eeuropeu com resultados ruinosos para o País e para a vida dos portugueses.
As consequências estão hoje patentes e perduram na sociedade portuguesa: regressão acentuada da capacidade produtiva do País; uma dívida pública sufocante; regressão drástica das condições de vida dos trabalhadores e do povo e dos seus direitos; agravadas vulnerabilidades estruturais que se expressam no plano produtivo, alimentar, energético, demográfico, de ordenamento de território, de infraestruturas e serviços públicos, que tornam Portugal numa nação extraordinariamente exposta a alterações adversas do quadro internacional.
Vulnerabilidades às quais se junta um conjunto de fortes constrangimentos, resultantes nomeadamente do Euro, que condicionam seriamente o desenvolvimento do País.
Agudos problemas, cuja solução reclama para sua superação uma política patriótica e de esquerda, como a que o PCP defende para o País.
Uma política que não está refém das imposições externas e dos interesses do grande capital como a que assume o actual governo minoritário do PS.
Uma política que tem como elementos decisivos, entre outros: a libertação do País da submissão ao Euro e à União Europeia; a renegociação da dívida pública para libertar recursos; a defesa e promoção da produção nacional e dos sectores produtivos, articulada com a valorização do trabalho e dos trabalhadores, como objecto e condição do desenvolvimento; a recuperação para o sector público dos sectores básicos estratégicos da economia; uma administração e serviços públicos ao serviço do povo e do País.
A Revolução de Outubro foi sempre, desde o seu primeiro momento, objecto das mais insidiosas e odiosas campanhas difamatórias. Cem anos passados e apesar do enorme esforço e empenhamento dos centros ideológicos do capitalismo internacional e da historiografia burguesa para diminuir a sua importância e apresentá-la aos olhos das actuais gerações como uma efeméride sem importância, a verdade é que, desmentindo-se a si próprios, vimo-los, neste tempo de passagem do Centenário, superando-se em meios e recursos, afadigados numa desmesurada cruzada anticomunista e contra a Revolução de Outubro.
Eles bem repetem que Outubro morreu, que nada já representa, mas para quem assim quer fazer que pensa, bem podia dispensar os quilos de papel e prosa que gastam a repisar mentiras e mistificações, o tempo gasto a construir fantasiosas histórias sobre a Revolução de Outubro.
Nós sabemos o que verdadeiramente os inquieta e os move. E o que os inquieta e os move, é saberem que a Revolução de Outubro é um acontecimento maior da história e que mesmo derrotada, tal como o havia sido a Comuna de Paris, permanece como semente de futuro que a luta dos povos há-de fazer germinar.
De facto, este tempo de passagem do Centenário tem sido pretexto para a difusão em grande escala do mais baixo e odioso anticomunismo. Por cá, assistimos, particularmente nos dias em volta da data do aniversário da Revolução de Outubro, ao avolumar do coro dos arautos da militância anticomunista com presença assídua no comentário e no editorial na comunicação social, martelando, à vez, os lugares comuns há muito fabricados nos laboratórios do anti-sovietismo, numa tarefa que contou com o concurso de “afamados” historiadores estrangeiros, escolhidos a dedo, como o senhor Orlando Figes, cuja neutralidade científica da sua obra se pode deduzir na parcialidade das opiniões que emitiram nas entrevistas que deram e nas estapafúrdias relações que estabelecem entre a Revolução e a realidade da vida internacional dos nossos dias.
Vimo-los a uns e a outros, a difundirem as mais torpes e estafadas mentiras não apenas para denegrir e diabolizar a Revolução de Outubro, mas os comunistas e o seu projecto, e até a deturpar deliberadamente o que de viva voz o PCP hoje afirma sobre o significado de tão marcante acontecimento.
Lá vieram as coçadas e estafadas teses do “golpe” de conspiradores, a Revolução produto de “aventureiros”, “um acaso” e não uma necessidade histórica, um acidente e não obra dos próprios trabalhadores e de um povo que com a sua luta abria as portas da sua própria libertação. Lá veio a tese mil vezes repetida do carácter particular e local da Revolução não repetível.
Mas o que assume um particular destaque, na campanha destes últimos dias é a concentração da invectiva contra Lenine e os primeiros anos da Revolução, numa tentativa de matar o ideal comunista no próprio berço.
Falam de uma violência brutal, uns de centenas de milhares mortos, outros de dezenas de milhões, responsabilizando Lenine e a Revolução, incluindo por uma guerra civil (1918-21) desencadeada pelo estrangeiro e pela contra-revolução interna. Falam de violência, condenando o agredido e absolvendo o agressor, omitindo descaradamente a contínua invasão militar estrangeira poucos meses após o nascimento da República dos Sovietes, de apoio e incitamento da contra-revolução interna à luta e liquidando em várias partes do território o poder soviético.
Na verdade, podia o novo poder revolucionário, alcançado praticamente sem que se desse um tiro, tomar como primeira decisão, propor a todos os beligerantes envolvidos na I Guerra Mundial negociações para se obter a paz, de uma forma justa e democrática, mas o que se difundia e difunde é uma vontade indómita de violência desse novo poder.
Podia o poder soviético aspirar e Lenine teorizar sobre a possibilidade do desenvolvimento pacífico da Revolução, mas o que a propaganda imperialista e a reacção internacional difundiam e hoje continuam a difundir, é a ideia de que a Revolução era intrinsecamente portadora do caos e da violência, porque o tinha inscrito no seu ADN.
Sim, houve muitas vítimas e o País dos sovietes atravessou dias difíceis, mas a responsabilidade não foi de Lenine, nem da Revolução, mas dos governos das principais potências capitalistas que organizaram a intervenção militar, em articulação com as forças da reacção interna.
A Rússia foi martirizada não por iniciativa do poder soviético, mas pela invasão de 14 países, pelas ofensivas, pelas revoltas subvencionadas, pelo bloqueio impiedoso do imperialismo.
A dimensão das campanhas contra a Revolução de Outubro tem uma primeira explicação: ela mostrou, pela primeira vez, a possibilidade de arrebatar o poder económico e político ao Capital e reorganizar a sociedade sem ser na base da exploração de classe. E, tão grande audácia não podia passar sem uma violenta resistência da classe dominante. São inúmeros os exemplos na história que mostram que as classes exploradoras nunca recuaram perante nenhum crime para defender o seu poder.
Bastaria apenas pôr os olhos no último balanço dado à estampa, pelo norueguês Jonh Galtung, fundador da disciplina dos Estudos da Paz, sobre a acção do imperialismo americano nos dois últimos séculos: lá estão mais de duas mil intervenções militares, por sua conta e exclusiva iniciativa. Contando apenas desde 1945, os EUA mataram mais de 20 milhões de pessoas em mais de 47 países.
Mas, nesta matéria de invectivar a Revolução e Lenine, o senhor Figes, o “aclamado autor britânico” assim classificado pelo anticomunismo caseiro e por ele erigido em expoente máximo do conhecimento sobre a Revolução de Outubro, é bem o protótipo da investigação preconceituosa e especulativa, assente em juízos fundamentalmente ideológicos e capaz das mais extravagantes extrapolações. Não se trata apenas da enviesada tese que afirma que a Guerra Civil foi um acto deliberado dos bolcheviques e um mecanismo que se tornou crucial nas Revoluções em todo o mundo. É o que dela deliberadamente se projecta como leitura da realidade de hoje.
A sua delirante conclusão de que nos nossos dias também o “ Daesh (o Estado Islâmico) é bolchevique” não é apenas opinião de um “artífice” da manipulação, tem como propósito deliberado promover a criminalização do comunismo e a sua identificação com terrorismo.
Mas a parcialidade deste e de outros refinados manipuladores da memória são as suas afirmações de que não há nada na Revolução que se possa reclamar como positivo.
Só a cegueira ideológica pode justificar não reconhecerem o vasto conjunto de grandes conquistas e realizações políticas, económicas, sociais, culturais, científicas e civilizacionais do socialismo na URSS.
Só uma deliberada opção ideológica pode escamotear o facto indesmentível da Revolução Socialista ter transformado a atrasada Rússia dos czares, um País com atrasos colossais, onde persistiam relações feudais, num País altamente desenvolvido, mais industrializado e socialmente mais avançado provocando efeitos extraordinários à escala planetária.
Só num processo de intenções ideológico se pode omitir o facto da Revolução e o poder soviético terem conseguido num curto período de tempo histórico, ter alcançado um significativo desenvolvimento industrial e agrícola, ter eliminado o desemprego, confirmando a superioridade da propriedade social e da planificação económica. Ter erradicado o analfabetismo e generalizado a escolarização e o desporto, garantiu e promoveu os direitos das mulheres, das crianças, dos jovens e dos idosos.
Tudo feito, apesar da intervenção de potências imperialistas, da guerra civil, do bloqueio económico e da sabotagem, de duas grandes guerras devastadoras.
Tanta abundante e profunda análise e conseguem escamotear que foi a pátria dos «sovietes», o primeiro País do mundo a pôr em prática ou a desenvolver como nenhum outro, direitos sociais fundamentais, como o direito ao trabalho, a jornada máxima de 8 horas de trabalho, as férias pagas, a igualdade de direitos de homens e mulheres na família, na vida e no trabalho, os direitos e protecção da maternidade, o direito à habitação, a assistência médica gratuita, o sistema de segurança social universal e gratuito e a educação gratuita.
A historiografia burguesa e os média dominantes omitem deliberadamente o que a propaganda imperialista a todo o custo esconde: o imenso contributo da URSS e do povo soviético para o avanço da luta emancipadora dos trabalhadores e dos povos, incluindo no apoio à conquista da independência de numerosas nações secularmente submetidas ao jugo colonial e o seu inquestionável papel de força mundial do progresso e da paz.
Victor Sebestyien, outra sumidade empenhada na reescrita da história que recorreu também ao anticomunismo doméstico, veio na mesma linha de criminalização da Revolução, proclamar do alto da sua cátedra que “a existência de Hitler e a II Guerra Mundial se devem à Revolução Russa”.
Nem mais, nem menos! E assim se lava e branqueia o criminoso papel do grande capital alemão e do próprio nazismo, a mais brutal expressão do fascismo e se reconstrói a história à imagem dos interesses dominantes. Assim se apaga a cumplicidade e apoio do grande capital alemão na ascensão do nazismo ao poder e do seu projecto que via no anti-comunismo e nacionalismo xenófobo nazi e no seu programa – de liquidação de liberdades e direitos democráticos, de militarismo e de expansão e domínio mundial –, o instrumento para concretizar a sua agenda de exploração, opressão e agressão.
Esta insultuosa e caluniosa ligação entre a Revolução e o fascismo, entre comunismo e fascismo tem outro objectivo - mostrar também que o projecto comunista é intrinsecamente perverso e anti-democrático.
Desde logo, transformando aquela que foi a mais democrática das formas de poder até então existentes – o poder dos trabalhadores, os sovietes, o voto universal, a participação directa, activa e criadora das massas no processo de construção da própria vida - num “totalitarismo” semelhante ao nazi-fascismo.
Isso, num tempo em que praticamente em nenhum país capitalista europeu ou americano, as grandes massas tinham direito a voto, apenas os proprietários e alguns estratos minoritários da população.
Neste afã de deturpação do projecto comunista que junta e equipara fascismo e comunismo, tentam a todo custo demonstrar uma incompatibilidade entre a Revolução de Outubro e a democracia, entre o socialismo e democracia, utilizando-a como uma arma de arremesso contra os partidos comunistas e revolucionários. Culpam a Revolução de Outubro de ser a portadora e conter em si os germes das desfigurações, erros e desvios por nós assinalados em congressos e não escondidos que conduziram à trágica derrota da URSS.
Mas como temos afirmado não é na Revolução de Outubro – a mais libertadora das revoluções contemporâneas – que se pode encontrar a origem do desaire que representou a destruição do socialismo na URSS, mas num “modelo” de construção do socialismo que, como temos afirmado, acabou por se afastar e contrariar o ideal e o projecto comunistas em questões fundamentais.
Não! O socialismo não é incompatível com a democracia. O socialismo precisa da democracia, da participação consciente dos trabalhadores e do povo para se afirmar e desenvolver. Não há socialismo sem a participação dos trabalhadores e do povo, o seu contributo, o seu empenhamento, a sua decisão, sem uma organização da sociedade com um funcionamento profundamente democrático.
É por isso que no centro do projecto político do PCP e para todas as fases e etapas do processo de desenvolvimento da sociedade portuguesa está a concretização da democracia nas suas vertentes política, económica, social e cultural, no quadro de um sistema político assente num Estado democrático representativo e participado.
Um projecto garantido e alicerçado na história quase centenária deste Partido Comunista Português em defesa da liberdade e da democracia e ao serviço dos trabalhadores e do nosso povo.
A campanha e o ataque sistemático ao ideal e ao projecto comunistas conduzido pelos centros de produção e reprodução da ideologia dominante só se coloca na dimensão que temos visto, por que a sociedade que a Revolução de Outubro projectava e construía é uma necessidade histórica.
E por muito que os defensores do sistema de exploração o apregoem, o século XX, como afirmava Álvaro Cunhal, “ não foi o século do ’fim do comunismo’, mas sim o século do ‘princípio do comunismo’ como concretização e edificação de uma nova sociedade para o bem do ser humano”.
Estamos a chegar ao fim das comemorações do Centenário da Revolução Socialista de Outubro, dessa Revolução que rasgou os caminhos para a construção de uma sociedade nova nunca antes conhecida pela humanidade.
Essa Revolução de memórias de lutas e de sonhos, de emancipação dos explorados e oprimidos, portadora de um vivo desejo de futuro e que hoje nos continua a dizer que outro mundo mais justo é possível!
Essa Revolução que permanece como fonte de inspiração para as lutas que hoje travamos fazendo frente à ofensiva do grande capital, do imperialismo, do lado dos trabalhadores e dos povos pela conquista da sua emancipação social e nacional.
Comemorámos Outubro, honrando e homenageando os seus obreiros e o seu imenso contributo para o avanço da luta emancipadora dos trabalhadores e dos povos, e reafirmando o seu carácter universal.
Comemorámos Outubro apresentando o acervo de realizações, conquistas e transformações progressistas que pela acção dos comunistas marcaram o último século, envolvendo todo o planeta.
Comemorámos Outubro reafirmando não apenas a validade do socialismo como solução para dar resposta aos grandes problemas dos povos e da humanidade, mas demonstrando a necessidade e possibilidade da superação revolucionária do capitalismo pelo socialismo e o comunismo.
Comemorámos Outubro e a sociedade que dela emergiu e se afirmou como uma força mundial da paz e da amizade entre os povos.
Comemorámos Outubro afirmando e valorizando o papel da classe operária, dos trabalhadores e dos povos, da sua unidade, organização e luta no processo de transformação social e, particularmente, o papel histórico da classe operária e dos seus aliados nessa realização pioneira e no porvir da sociedade nova, sem classes sociais antagónicas e liberta da exploração do homem por outro homem.
Comemorámos Outubro tendo presentes os seus êxitos e derrotas, reflectindo, colhendo e utilizando os ensinamentos dos complexos processos de edificação da nova sociedade que se desenvolveram pisando terreno desconhecido e novo.
Comemorámos Outubro reafirmando a determinação inabalável do PCP de lutar para que o socialismo se torne uma realidade do amanhã do povo português.
Saímos destas Comemorações mais fortalecidos, mais conhecedores e mais convictos da justeza da nossa luta.
É municiados com a avaliação que fazemos da Revolução de Outubro e com as experiências de cem anos de luta dos comunistas e revolucionários de todo o mundo que em Portugal continuaremos a luta pela afirmação do ideal e o projecto comunistas.
É munidos com a experiência acumulada pelo movimento comunista ao longo de cem anos de luta que afirmamos com orgulho a independência e a identidade de classe do nosso Partido, a sua ideologia marxista-leninista, a sua natureza patriótica e internacionalista.
Um Partido Comunista que não abdica de o ser, determinado, combativo, consciente do seu papel, firme no seu ideal e na afirmação do seu projecto transformador e revolucionário, e que tem sempre presente no horizonte da sua acção e intervenção a construção da sociedade nova – o socialismo, condição de futuro inseparável da plena libertação e realização humanas.
É com a profunda convicção de que o socialismo e o comunismo são o futuro da humanidade que continuamos a nossa luta, firmemente conscientes que o futuro se constrói e conquista com a luta dos trabalhadores e do povo!