sábado, 7 de maio de 2016

A Europa do nosso descontentamento

                                     
Uma vez mais se constata que as vozes avisadas, há anos sugerindo um rigoroso controlo de transferências ou movimentações monetárias do nosso País para outros países ou continentes, não obtiveram o acolhimento que o bom senso e a defesa intransigente da democracia reclamavam.
Por outro lado, a falta de regulação eficiente e atempada do sector bancário, mas também a obediência cega às normas impostas pelo BCE, Banco Central Europeu, continuam a demonstrar que somente o controlo público da Banca ou mesmo a nacionalização da mesma contribuirão para suster a corrupção e a fuga de capitais, pois está claramente visto não existir controlo eficaz para este negócio privado quando ele se constitui em lobby e concentra capital.   
Os escândalos no BPN, BANIF, BES e BPP, agora em investigação pelo Ministério Público, ao qual não têm sobrado tempo, meios humanos e materiais para levar a cabo tão espinhosa missão, conduzem a população portuguesa para sentimentos de indignação e revolta, mais acentuados quando se ouve alguns «iluminados», por exemplo na área da anterior governação de direita, declararem que não há dinheiro ou que estamos a viver acima das nossas possibilidades e, mesmo em concertação social, argumentarem até à exaustão contra um irrisório aumento do ordenado mínimo nacional, sabendo que milhares de milhões de euros, entre 2010 e 2014 mais de 10 mil milhões, desapareceram do País na voragem das offshores e da especulação bolsista ou economia de casino, conforme se tornou agora mais visível pela investigação do Consórcio Internacional de Jornalistas conhecida como Panama Papers e que deve ter acordado muito boa gente para uma realidade de que não se apercebia ou não queria perceber.
Porém a procissão ainda vai no adro, se atentarmos na política oficial da União Europeia em que o Mecanismo Europeu de Estabilidade, acordado pelos ministros das finanças europeus e em Portugal aprovado também na Assembleia da República pela maioria de direita, irá passar do papel à prática com mais visibilidade, ou seja, o chamado bail-in, salvamento de um banco com seus próprios recursos, dos seus accionistas e dos depositantes, claro está, será uma realidade e a teoria é simples, pois, em caso de dificuldades, nada melhor do que recorrer aos cidadãos que, tidos como os culpados da má administração realizada pelo Estado, devem ajudar o País a recuperar e ser obrigados a pagar a crise que não provocaram.
Não devemos perder de vista que, dos 10 mil milhões de euros até agora contabilizados como transferências, a maior fatia cabe a empresas e os dados relativos a contribuintes singulares apontam para uma saída de 675 milhões de euros, números recolhidos pelo Fisco a partir de informação reportada pelos bancos, no quadro da declaração Modelo 38 que obriga estas entidades e comunicarem à administração fiscal, por via electrónica, as transferências realizadas por ordem de pessoas individuais e colectivas, ficando de fora as transferências realizadas à margem da lei, para as quais a Administração Tributária realiza acções de controlo que podem incluir investigações, se houver meios para tal o que, infelizmente e como se constata, não tem sido prática corrente.
Os obstáculos não ficam por aqui, mesmo quando a vontade política não desiste de investigar e senão vejamos a posição do vice-governador do BCE o qual, instado a proporcionar esclarecimentos no âmbito da Comissão de Inquérito Parlamentar ao Banif, respondeu pura e simplesmente que só presta contas ao Parlamento Europeu e não aos parlamentos nacionais e ele próprio, argumentando segredo profissional, recusou depois prestar informações e pareceres técnicos solicitados pelos eurodeputados portugueses do PCP sobre a supervisão do sistema bancário português, ou seja, uma no cravo outra na ferradura e tudo fica na mesma.

Esta União Europeia que tantas ilusões levou a tanta gente e ainda continua a ser considerada o eldorado para outra tanta, parece ter chegado ao princípio do fim e os povos europeus do «clube» começam a acordar para a dura realidade duma coesão social e dum desenvolvimento económico cada vez mais distantes, em contraste com a contínua acumulação de riqueza nas mãos de alguns. 

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