quinta-feira, 13 de agosto de 2015

Afinal, o que é uma grande alma?

                                   
Na perspetiva de Bertold Brecht, que podemos apreciar devidamente na sua parábola A Alma Boa de Setsuan, a grande questão colocada pelo cristianismo é saber como devemos coadunar a defesa dos nossos próprios interesses com os interesses dos coletivos, de como ser bom para si próprio sem deixar de ser bom para o próximo.
Este notável dramaturgo, poeta e encenador de origem alemã, nascido a 10 de Fevereiro de 1898 em Augsburgo, procura tratar didaticamente na obra atrás referida a complexa disciplina da ética, de tal forma que qualquer cidadão tenha oportunidade de se questionar sobre as dificuldades de praticar o bem e, hoje em dia no nosso País, em que o exemplo dos governantes não será propriamente o da melhor atitude ética para com os governados, este tema constitui uma inquestionável oportunidade de inspiração.
Como conciliar os interesses privados com os públicos ou poderá qualquer arte intitular-se como arte se não tornar claro de alguma forma os seus compromissos políticos, constituem outras interrogações colocadas por Brecht, para as quais encontra respostas essencialmente de carater social, pois não podemos eticamente confundir a prática do bem com a tolerância para com os malfeitores.
E aquilo que os malfeitores da vida pública mais desejam é que os cidadãos se desliguem da política, deixem de exercer a cidadania ou de participar nas decisões que os afetam, pois desta forma limitar-se-ão depois ao lamento.
O atrás exposto surgiu por termos sido surpreendidos há dias com uma reportagem televisiva realizada pela estação pública, subordinada ao tema do aniversário da queda do BES e tendo como principal objetivo mostrar a capela da família Espírito Santo, anexa à residência e onde aos domingos tem sido celebrada missa para familiares e amigos mais próximos.
O celebrante há 14 anos continua a ser o mesmo e demonstrou ter grande confiança, amizade e admiração por Ricardo Salgado, de tal forma que terá sido mesmo seu confidente ou confessor, durante o referido período de tempo, se tivermos em conta as palavras proferidas à jornalista de serviço, palavras essas que poderão causar mesmo certa perplexidade no seio dos católicos, apostólicos, romanos, pois, sendo confidências, infringirão as regras da igreja sobre esta matéria ou então constituirão uma nova abordagem para com os seus seguidores, o que se torna, no mínimo, uma notável mudança de conduta ético-religiosa.
O padre em causa citou algumas palavras do ex-presidente do BES ou ex-dono disto tudo, como queiram, algumas das quais aqui são referidas: «todos me abandonaram e a minha mulher tem sido o meu anjo, a minha força»; questionado pelo padre sobre como resiste a estas coisas do Portucale, Mensalão, Madrid, Brasil, respondeu «é verdade, é verdade, este bocadinho que eu venho aqui, venho buscar força ao nosso Deus para continuar, para caminhar» e o padre desabafa à jornalista «é um homem triste, perdeu uns quilinhos, é um homem amargurado, mas um homem que tem uma grande alma e que não desiste».

Fica bem patente a admiração incondicional do padre pelo fiel e de tal modo que, independentemente da decisão da justiça terrena perante os imensos e inaceitáveis comportamentos praticados contra o País e as pessoas, o pároco já lhe concedeu a absolvição, que eventualmente poderá ser extensiva ao presidente de alguns portugueses, ao primeiro-ministro, ao governador do Banco de Portugal, à ministra das Finanças, à administração da CMVM e a todos quantos foram cúmplices, por ação e omissão, deste verdadeiro pecado criminoso violador dos mais elementares princípios da ética e da moral, praticado por esta grande alma.

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