Liberdade de expressão
Os primeiros
dias do novo ano ficam indelevelmente marcados, a nível internacional, pelos
acontecimentos em França que tiraram a vida a várias pessoas, umas dedicadas ao
cartoonismo satírico ofensivo, outras bem conhecidas como terroristas nos
arquivos do FBI, mas que a falta de comunicação entre França e Estados Unidos
não conseguiu levá-los à prisão atempadamente e ainda outras vítimas inocentes
deste crime abominável que a todos indignou.
Este fenómeno
não é, porém, novo se nos lembrarmos dos Versículos Satânicos da autoria de
Ahmed Salman Rushdie autor e ensaísta de origem indiana, condecorado na
Grã-Bretanha onde recebeu o título de «Sir», contudo merecendo da comunidade
islâmica imensa indignação e protesto dado o conteúdo provocatório e pejorativo
do seu livro em relação ao Alcorão, ao profeta Maomé e ao Islão, sendo por isso
proibido de circular em vários países, mas também não esquecemos o caso do
jornal dinamarquês professando ideologia nazi e autor das chamadas caricaturas
de Maomé, consideradas como blasfémia e levando ao fecho da publicação, ou
seja, os muçulmanos reagiram quando a sua cultura e religião foram
vilipendiadas da mesma forma que os católicos também se manifestaram, por
exemplo em Portugal, com fortes críticas e polémicas face ao conteúdo de
algumas obras de José Saramago (O Evangelho Segundo Jesus Cristo e Caim), nos
quais a interpretação bíblica do autor, embora irreverente e irónica, não
tivesse usado o insulto contra a divindade e religião católicas.
A liberdade de informação é abarcada pela liberdade de expressão e
configura-se pela liberdade de informar, de ser informado e de se informar.
Apesar da sua correlação direta, a liberdade de expressão distingue-se da
liberdade de informação na medida em que esta tem como objetivo a expressão de
factos noticiáveis, onde se torna imprescindível a análise da veracidade dos
mesmos a ser levada ao conhecimento.
No Artigo 38º da nossa Constituição lê-se que «A liberdade de imprensa
implica a liberdade de expressão e criação dos jornalistas e colaboradores, bem
como a intervenção dos primeiros na orientação editorial dos respectivos órgãos
de comunicação social, salvo quando tiverem natureza doutrinária ou
confessional.
A situação agora
vivida em França suscita algumas perguntas, talvez incómodas para alguns, tais
como: Quem é responsável por manter no desemprego milhões de jovens europeus,
nos países mais desenvolvidos da União Europeia? Quem é responsável pelas
políticas económicas que, em nome da confiança dos mercados financeiros,
perpetua o desemprego e a pobreza entre os naturais e os imigrantes de segunda
e terceira geração? Quem destruiu o desenvolvimento de África com a imposição
do colonialismo e agora do modelo neoliberal, criando o desespero das
populações que hoje se entregam ao tráfico e à morte no Mediterrâneo?
Quem fala do
terrorismo e dos terroristas porque não informa o cidadão comum que o expoente
máximo destas ações, Bin Laden, foi visita do Sr. Bush e que o aliado Arábia
Saudita financia o ISIL (Estado Islâmico) conluiado com Israel na tentativa de
invasão da Síria, estado laico a abater?
O imperialismo
norte-americano, na sua ânsia de hegemonismo e apropriação de posições geo
estratégicas em países fornecedores da matéria-prima denominada ouro negro, invadiu
Afeganistão, Iraque, Líbia, Jugoslávia, aproveitando as alianças reais com a
NATO/UE e precárias com a Al Qaeda para retirar os soviéticos do caminho no
Afeganistão e os sérvios do Kosovo e da Bósnia, lançar Sunitas contra Xiitas,
causando centenas de milhares de mortos, destruição de património histórico e
verdadeira barbárie como todos os dias verificamos.
A situação
internacional encontra-se marcada por ingerências e agressões contra estados
soberanos, instigando ódios religiosos, conflitos étnicos e o advento de forças
de extrema-direita, nazi-fascistas e xenófobas, situação bem patente na
Ucrânia, Grécia, Itália, França e Espanha.
O ataque ao
Hebdo, onde gente claramente provocadora em exagero coabitava com jornalistas
de muito bom, salutar e satírico humor, não foi somente uma expressão de
vingança, mas constitui o resultado daquilo em que se tornou a nossa sociedade,
onde impera um exacerbado individualismo e ceticismo, consumismo frustrado,
culto da vulgaridade, da ignorância e dos «reality shows», tornando-se assim o
alvo predileto da manipulação e do obscurantismo.
O imperialismo
abriu a caixa de Pandora, mas será que vai encontrar no fundo a esperança?
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