domingo, 15 de março de 2015

A contrição iníqua


Presidente da Comissão Europeia é o cargo com mais poder na União Europeia, pois é responsável pela atribuição de pelouros aos membros da Comissão, podendo mudá-los ou demiti-los, se necessário. Ele determina a agenda política da Comissão e todas as propostas legislativas que produz, dado ser o único órgão da Comunidade que pode propor leis. O cargo foi criado em 1957 e é nomeado pelo Conselho Europeu e pelo Parlamento Europeu para um mandato de cinco anos. Após a eleição e juntamente com a sua Comissão, torna-se responsável perante o Parlamento que tem direito a censurá-lo. Atualmente o presidente é o luxemburguês Jean Claude Juncker, que tomou posse a 1 de Novembro de 2014, escolhido por ampla maioria, 422 dos 751 deputados europeus.

Considerado um europeísta e federalista convicto, Jean Claude Juncker conhece bem os corredores de Bruxelas, dada a sua longa carreira política, incluindo a chefia de Governo do Luxemburgo e, como tal, foi membro do Conselho Europeu entre 1995 e 2003. No quadro das lideranças rotativas semestrais, presidiu ao Conselho Europeu por duas vezes, em 1997 e em 2005 e foi também titular da pasta das Finanças do Luxemburgo durante duas décadas, de 1989 a 2009, tendo presidido ao fórum de ministros das Finanças da zona do euro, o Eurogrupo, entre 2005 e 2013. Trata-se, pois, duma personalidade bem posicionada para conhecer o seu campo de ação como ninguém, razão pela qual as suas afirmações, a seguir reproduzidas, pecam por tardias e hipocrisia, embora constituam um libelo acusador em relação às políticas sociais e económicas seguidas pela União Europeia, não indiciando, no entanto, qualquer vontade política para mudar de rumo.
Além de criticar e bem a postura da anterior Comissão, liderada por Barroso, sobre o problema grego e também quanto à confiança cega na «troika», entre outras afirmações sobressaem as seguintes: «pecamos contra a dignidade de Portugal» e «a troika não tem legitimidade democrática». Com efeito e bem vistas as situações, existe um atentado à dignidade dos portugueses, gregos e irlandeses quanto ao conteúdo político dos memorandos aplicados aos referidos povos, mas o que está em causa nas referidas afirmações é elas não coincidirem com a vontade expressa do prosseguimento da mesma política, consubstanciada na continuação da consolidação das finanças públicas a qualquer custo e sem ideias para romper com os planos da «troika», apesar da generalizada contestação sobre os resultados nefastos para os povos submetidos e de que em Portugal somos exemplo vivo.
A satisfação reside na Alemanha, onde o ministro das finanças Wolfgang Schauble afirmou em conferência que «Portugal é a melhor prova» de que os programas de ajustamento funcionam, ou seja, o bom aluno bajulador, representado pela ministra das finanças, alvo dos elogios do mestre, mas sem uma palavra para os sacrifícios injustamente distribuídos pela população portuguesa até agora e que irão continuar no futuro, tendo em conta o Orçamento de Estado para 2015, onde os 92.424 milhões de euros inscritos na rubrica «operações da dívida pública» são mais do que o triplo dos 29.000 milhões destinados à Saúde, Educação, Segurança Social e outras prestações sociais e se olharmos para o milhão de desempregados, o milhão de utentes sem médico de família, os 2 milhões de compatriotas no limiar da pobreza, os 300 mil emigrados à força, os 23.089 professores, 2107 enfermeiros, 10.842 administrativos e 21.834 auxiliares pura e simplesmente despedidos e a fazerem falta.
É este ciclo infernal que nos compete terminar, mas o objetivo só será possível com novo rumo e novas políticas protagonizadas por um novo governo patriótico e de esquerda que nos relance para o desenvolvimento económico, a justiça social e a independência como País soberano. O exemplo grego servindo, pelo menos, para vincar um forte desejo de mudança, bem patente nos povos submetidos ao jugo imperial e à financeirização das economias numa Europa monopolista e belicista, não pode ser criticado.

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