domingo, 23 de março de 2014

Uma justa homenagem

Intervenção de Jerónimo de Sousa, Secretário-Geral, Matosinhos, Evocar Óscar Lopes. O homem e o seu tempo

Homenagem justa a quem a cultura portuguesa, a resistência à ditadura fascista e o Portugal democrático muito devem


É com grande alegria que, como Secretário-Geral do PCP, partido em que Óscar Lopes dedicadamente militou até nos deixar fisicamente há um ano atrás, me associo a esta Homenagem promovida pela Direcção da Organização Regional do Porto e do seu Sector Intelectual.
Homenagem justíssima ao homem, ao intelectual, ao democrata, ao patriota e ao comunista, a quem a cultura portuguesa, a resistência à ditadura fascista e o novo Portugal democrático saído da Revolução de Abril muito devem.
As intervenções da Professora Fátima Oliveira e do camarada José António Gomes abordaram em profundidade o perfil do intelectual de excepção que foi Óscar Lopes nas múltiplas vertentes em que se desdobrou: a sua insaciável curiosidade científica, a sua excepcional actividade de pedagogo, publicista, a sua intensa actividade cívica e política. Permitam-me ainda assim algumas notas de carácter biográfico que, embora muitíssimo incompletas, evidenciam que evocamos hoje um homem, um intelectual e um revolucionário comunista de excepção e que, além do seu exemplo de cidadão, nos lega uma obra notável onde o rigor científico, a inspiração criativa e o ponto de vista de classe se fundem naturalmente.
Óscar Lopes nasceu aqui, no concelho de Matosinhos, em Leça da Palmeira, em 1917, ano do maior acontecimento revolucionário do século XX, a Revolução Socialista de Outubro, a cujos ideais libertadores aderiu e a que se manteve fiel até aos seus últimos dias. Da vida modesta e sofrida das gentes da sua terra, dos humildes pescadores, recebeu o impulso de revolta contra a miséria e a exploração e de amor ao povo que moldaram a sua consciência política, a sua identificação com os interesses da classe operária, a sua opção pelo ideal comunista. Foi assim que aderiu ao PCP em 1945, realizou as mais diversas tarefas na clandestinidade e depois do 25 de Abril, tendo sido membro do Comité Central do PCP entre 1976 e 1996.
Professor, investigador, publicista, Óscar Lopes foi autor de uma vasta obra, sobretudo no domínio da Linguística e da Crítica Literária, em que se destaca esse monumento que é a História da Literatura Portuguesa de que foi co-autor, deixa colaboração dispersa em inúmeros jornais e revistas (como a Vértice e a Seara Nova), e o seu nome fica ligado a numerosas colectividades e associações culturais como a Associação Portuguesa de Escritores, a Associação de Jornalistas e Homens de Letras do Porto ou a Universidade Popular do Porto de que foi um dos fundadores .
Mesmo quando perseguido pela PIDE e impedido de lecionar no nível que a sua elevada competência impunha, soube combinar a sua superior actividade de homem da cultura com uma intensa intervenção social e política.
Profundamente identificado com o sentir e as aspirações do seu povo e os problemas do seu País, ao lado de outros lutadores destacados como Virgínia Moura, Lobão Vital, José Morgado, Ruy Luís Gomes ou Armando de Castro, Óscar Lopes desenvolveu intensa actividade política, participando desde 1942 nas mais diversas acções da Oposição Democrática antifascista tendo pertencido ao MUNAF, ao MUD, ao MND e mais tarde à CDE e à Comissão Nacional de Socorro aos Presos Políticos. Preso pela PIDE duas vezes, a primeira das quais em 1955 no processo dos Partidários da Paz, viria a passar vários meses nas cadeias fascistas. Afastado da Universidade retomou mais tarde o ensino e, logo a seguir ao 25 de Abril, foi eleito Presidente do Conselho Directivo da Faculdade de Letras e exerceu o cargo de Vice-Reitor da Universidade do Porto. Foi candidato do PCP à Assembleia da República em várias eleições, tendo exercido a função de deputado, e eleito na Assembleia Municipal do Porto.
Para o PCP é uma grande honra e motivo de legítimo orgulho que este intelectual de excepcional valor que militou 70 anos nas sua fileiras seja um dos seus, um elo particularmente valioso e querido da cadeia de solidariedade ideológica, política e humana que é este grande colectivo partidário. Colectivo que, graças à firmeza de militantes modestos e dedicados como Óscar Lopes, o fascismo não conseguiu destruir, que se tornou o grande partido da Liberdade e da Revolução de Abril e se afirma hoje como força necessária e insubstituível na luta pela alternativa democrática e patriótica que a grave situação de Portugal reclama.
Não foi certamente por acaso que foi ele o autor inspirado do prefácio do romance “Até Amanhã Camaradas” de Manuel Tiago, como não são de circunstância as palavras com que Álvaro Cunhal se referiu um dia a Óscar Lopes afirmando que “toda essa vida notável, em si mesma, se torna ainda mais notável porque Óscar Lopes a soube e sabe viver com a serenidade e simplicidade que dão a sabedoria e a modéstia”.
Esta homenagem a Óscar Lopes, sem o afirmar explicitamente, integra-se de facto nas comemorações do 40º aniversário da Revolução de Abril, comemorações em que, para que se não esqueça, é necessário lembrar o que foi a longa noite fascista e, sem esquecer ninguém, lembrar e honrar aqueles que se destacaram no combate à ditadura e contribuíram para a conquista da Liberdade e para as grandes transformações revolucionárias que então abriram a Portugal o caminho do socialismo.

Sem comentários:

Enviar um comentário