Um jovem que sofreu um
acidente de viação há dias, em Chaves, teve de fazer 400 quilómetros de
ambulância para ser visto por uma equipa de neurocirurgia, dado não haver vagas
nos hospitais próximos.
Necessitando de
transferência para uma unidade de neurocirurgia, Chaves não tem a especialidade,
os hospitais mais próximos, Porto, Gaia, Matosinhos e Braga, informaram que não
tinham vagas, pelo que acabou por ser encaminhado de ambulância para o Santa
Maria, em Lisboa, com mais de quatro horas de viagem, pois o helicóptero também
não tinha condições de segurança para levantar voo. Os serviços estavam cheios,
as vagas estavam preenchidas, no Norte e Centro ninguém o recebeu nem atendeu,
teve de ir para o sul.
Sendo
escandalosa, não é para surpreender, no entanto, esta situação, pois fecharam
centros de saúde, urgências hospitalares e outras valências, o transporte de
doentes está um caos, com problemas nos bombeiros e no INEM, a linha de saúde
24 não funciona com regularidade, continua o desinvestimento na área da Saúde e
pelo contrário este ano há mais 300 milhões de euros de cortes, os
constrangimentos ao nível de recursos humanos continuam com falta de médicos de
família, mas emigram médicos e enfermeiros e agora anda o ministro à pressa a
tentar recrutar médicos reformados, os tempos de espera para consultas e
cirurgias aumentam de tal forma que há utentes que vão ficando pelo caminho, há
dificuldades na obtenção de medicamentos cada vez menos comparticipados e na
área do cancro, um dos maiores flagelos da sociedade, continuam as dificuldades,
embora os profissionais tentem abnegadamente ultrapassar os problemas
existentes, Paralelamente e na semana passada, a Espírito Santo Saúde deu
entrada na Bolsa de Valores com pompa e circunstância, palmas e champanhe,
abraços e entrevistas, beneficiando da transferência direta de milhões de euros
do Orçamento de Estado, ou seja, continua em curso a chamada reforma da Saúde
começada na governação PS e seguida nesta do PSD/CDS. O negócio floresce para
os grupos económicos que operam no sector, enquanto os utentes pagam mais pelas
taxas moderadoras e pelo acesso a outros serviços no âmbito do SNS. No passado dia 11 deste mês
decorreu o XXII Dia Mundial do Doente e, independentemente de filosofias ou
crenças, ninguém consegue ficar indiferente ao sofrimento causado por diversas
enfermidades físicas e mentais, razão pela qual é chocante ver transformar a
Saúde num «chorudo» negócio à custa do erário público.
Noutra área, a
Cultura, com a qual, pelos vistos, a direita não lida bem, somos surpreendidos
pelo surrealismo da tentativa de venda à sucapa das obras de Miró e, de tal
forma, que chegamos ao vexame de ouvir da empresa leiloeira britânica a
reprimenda «aqui só se vendem obras cumprindo as leis a que as mesmas estão
sujeitas». Já anteriormente e em relação à classificação das Fundações para
extinção, foi resolvido pelo executivo governamental extinguir a Fundação Paula
Rego, detentora dum acervo artístico admirado em todo o mundo e levando a
pintora a solicitar a devolução de 186 obras emprestadas, porém, este mesmo
executivo manteve a Fundação do PSD Madeira para onde terão sido canalizados,
entre 2012 e 2013, mais de milhão e meio de euros, numa demonstração de
critérios culturais no mínimo enviesados.
E como não há
duas sem três, eis que surge a «clarividente» medida de sortear pelas Finanças automóveis
topo de gama para cativar o pedido de faturas, a única forma encontrada para dizer aos cidadãos que devem
pagar impostos, pois assim podem ganhar um carro, quando todos sabemos ser
através das off-shores e da
deslocação de sedes de grandes empresas para outros paraísos fiscais que a fuga
se processa, isto num País em que as micro, pequenas e médias empresas
se encontram a braços com o aumento do pagamento especial por conta, do IVA e da
falta de consumo interno, num País com milhão e meio de desempregados e os que
trabalham fazem-no cada vez mais com salários de miséria, com cerca de três
milhões de pobres, em que imensas crianças encontram na Escola a primeira
refeição do dia e os seus avós se confrontam com roubos nas suas reformas e
pensões,
Curiosamente, as
áreas atrás referidas (Saúde, Cultura, Finanças) encontram-se consagradas na
nossa Constituição, em cujo texto preambular aprovado em 1976 se pode ler que
«a Assembleia Constituinte afirma a decisão do povo português de defender a
independência nacional, de garantir os direitos fundamentais dos cidadãos, de
estabelecer os princípios básicos da democracia, de assegurar o primado do
Estado de Direito Democrático e de abrir caminho para uma sociedade socialista,
no respeito da vontade do povo português, tendo em vista a construção dum País
mais livre, mais justo e mais fraterno».
Sinais dos
tempos do nosso quotidiano que temos de mudar, pois só nós o podemos fazer e
com confiança no futuro, mas a confiança exige luta, a menos que queiramos de
novo seguir os caminhos da repressão e obscurantismo de que nos libertamos com
tanto custo no 25 de Abril.
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